Mago vagando na floresta

Anahuasca - Estudo sobre análogos da Ayahuasca

Publicado em 03 de setembro de 2025

Ayahuasca é uma bebida enteógena amazônica preparada com pedaços do cipó Banisteriopsis caapi (também conhecido como jagube ou mariri), e folhas do arbusto Psychotria viridis (também chamada chacruna, ou rainha). Mas essas plantas são nativas da floresta amazônica, e sua disponibilidade é bastante limitada ao redor do mundo. Assim, alguns psiconautas começaram a investigar plantas com propriedades semelhantes, para preparar poções com o mesmo efeito da ayahuasca. O primeiro estudo aprofundado a respeito foi publicado por Jonathan Ott num livro intitulado "Ayahuasca Analogues - Pangæan Entheogens", de 1994.

Os chamados “análogos da ayahuasca", ou "anahuasca", são preparações que buscam reproduzir a sinergia clássica entre as substâncias dimetiltriptamina (DMT) e inibidores da monoaminoxidase (IMAOs) presentes na ayahuasca. O livro de Ott menciona dezenas de plantas contendo substâncias semelhantes, e também a possibilidade de usar substâncias isoladas ou sintéticas, como cristais de DMT e IMAOs, em preparações conhecidas como "pharmahuasca". A pharmahuasca também abrange preparações usando medicamentos com efeito semelhante, sendo o caso da Moclobemida, usada por psiconautas para substituir o cipó B. caapi. O próprio autor do livro testou algumas dessas combinações.

Livro ayahuasca
Minha cópia de estudo do livro de Jonathan Ott

Comecei a perceber a importância dessas preparações durante minhas pesquisas sobre ayahuasca. Ao buscar relatos de experiências em fóruns online encontrei muitas preparações feitas com plantas que não fazem parte da ayahuasca tradicional. Frequentemente os membros dos fóruns confundiam ingredientes tradicionais com análogos, chamando diversas receitas diferentes simplesmente de "ayahuasca. Nesses mesmos fóruns existem debates sobre a validade da comparação entre a ayahuasca tradicional e essas novas preparações, com defensores e críticos das novas receitas. Não cabe a mim julgar, mas na época me pareceu importante acompanhar essas novas receitas. Em pouco tempo reuni uma quantidade considerável de relatos, e logo resolvi sistematizar a busca pelos análogos da ayahuasca.

Cabeçalho de um fórum sobre ayahuasca, infelizmente extinto

Convidei alguns colegas com interesse no tema, e desenhamos o projeto. Foi uma espécie de revisão independente, com objetivo de estimar a adoção dos análogos da ayahuasca, identificar quais as combinações de plantas mais comuns, e avaliar os relatos de experiências. Infelizmente não existiam muitos estudos em que o conteúdo a revisar são postagens em fóruns online, por isso o método seguiu a lógica de uma revisão sistemática, mas foi um tanto experimental. Reunimos as discussões que haviam ocorrido nos últimos 10 anos (entre 2012 e 2022) em 4 comunidades: bluelight.org, drugs-forum.com, r/Ayahuasca e r/DrugNerds.

Após analisar milhares de postagens, identificamos 339 discussões mencionando pelo menos 1 ingrediente, incluindo 42 plantas, 12 drogas sintéticas, e 11 alcaloides vegetais purificados. Muitos desses ingredientes não são análogos, mas aditivos que visam modificar de alguma forma o efeito da preparação. A fonte mais popular de DMT é a árvore Jurema Preta (Mimosa tenuiflora), do nordeste brasileiro. E a principal fonte de IMAOs é a Arruda da Síria (Peganum harmala). Conforme minha impressão inicial, 48% das discussões não diferenciavam ayahuasca e anahuasca, o que significa que muitos usuários de um, na verdade, estão usando o outro.

A grande variedade de ingredientes mencionados levanta a questão dos riscos envolvidos no uso dessas preparações. Infelizmente não há estudos suficientes que atestem pela sua segurança, e eu contraindicaria seu uso até termos mais dados. Nossa pesquisa também serve como ponto de partida para a investigação de toxicidade e possível efeito terapêutico de cada ingrediente.

Novamente, não cabe a mim julgar o valor de uma ou outra preparação, é certo que a ayahuasca já é suficientemente estudada para atestar um nível de segurança aceitável e efeitos terapêuticos promissores. Também considero que os rituais tradicionais no uso da ayahuasca são um fator potencialmente positivo, e algo que não está presente no uso da anahuasca. Mas as preparações análogas também podem ter vantagens, no caso da pharmahuasca há facilidade de padronização, e com isso maior controle de variáveis, permitindo investigar com maior rigor os estados ampliados de consciência.